Pouco mencionado pela imprensa daqui, Peter Jackson, diretor inglês de indiscutível talento, lançou “They Shall Not Grow Old”, ou Eles Não Envelhecerão, nos EUA e Europa com muito sucesso. Tem mais apelo a eles que nós, é verdade, mesmo que tenhamos participado da I Guerra Mundial. Poucos sabem disto.
Ah, sim, claro, Jackson foi o diretor de “The Lord of The Rings”, o Senhor dos Anéis, mas isto agora é menos importante que o seu documentário, trabalho forte, pungente mesmo, tocante, com depoimentos de combatentes inéditos e impressionante esforço de pesquisa e restauro de imagens, que foram cuidadosamente colorizadas e até trazidas ao 3D.
Resultado: uma homenagem mais que justa a uma geração que morreu pelos campos de batalha da Europa, especialmente, sendo que por ela, ao menos um milhão de britânicos deram suas vidas.
Uma guerra confusa, pouco entendida, sem grandes movimentos, suja, de corpos estraçalhados, e de real avanço na tecnologia da indústria da guerra… Estima-se que perto de 8 milhões de pessoas tenham morrido, pelo menos 1,8 deles, alemães.
Todas as imagens vêm dos arquivos do Imperial War Museum (que são cinco museus espalhados pelo Reino Unido, três deles em Londres) e que passaram pelo trabalho de escolha, restauro e de aplicação de tecnologias 3D e de colorização, que comentávamos. A narração nos transporta para um tempo que já não existe, feita por veteranos da Grande Guerra, selecionada entre mais de 600 horas de entrevistas no arquivo da BBC e do IWM.
As cores tornam o documentário mais próximo de nós, andamos por trincheiras e hospitais de campanha. As vozes dos soldados e ex-oficiais trazem informações comoventes e às vezes muito, mas muito assustadoras. O Diretor realizou o filme em homenagem ao seu avô, principalmente. Impossível não nos sensibilizarmos com a narrativa, que acreditem, não trata de atos heroicos ou política.
O que interessa são as vidas captadas e perdidas, os homens dos lados opostos do conflito absurdo, de impérios que iam chegando ao seu fim dos seus dias de glória. Entender o real sentido da guerra é tarefa complexa. Esqueça suas aulas de História quando criança ou adolescente, cuja versão simplista estaria no assassinato do arquiduque Francisco Ferdinando, herdeiro do trono da Áustria-Hungria, por um militante da organização terrorista Mão Negra (Gavrilo Princip) um nacionalista eslavo. (O assassinato do arquiduque ocorreu em 28 de janeiro de 1914, em Sarajevo, capital da Bósnia. Sua amada esposa, Sofia, morreria também…)
O fato é recheado de desconfianças e teorias da conspiração.
Ao final do documentário, já exibido por aqui pelo “History”, temos uma situação sem precedentes, uma sociedade que não acolhe seus combatentes, que não entende a profundidade e o sofrimento pelo o qual passaram. Desempregados e até segregados…
Não contarei o final, claro, esta descoberta deverá ser de cada espectador, mas o anúncio do final do conflito, com a visão de soldados apenas sentados no chão de cidades destruídas, cansados, às vezes encostados uns aos outros, sem uma comemoração, um sorriso sequer, jamais sairá de minha memória…
Manoel Higino é economista, apaixonado por História, e pode contar sem atrapalhar o filme que o Brasil participou do conflito bem em seu final. Uma delegação médica rumou à Europa… A maioria da missão pegou gripe espanhola e muitos morreram, ficaram confinados… Uma tragédia a mais ao cenário de horrores entre 1914 e 1918.